quinta-feira, 6 de outubro de 2005

Eclipse Anular do Sol - Parte 2


Este é o relato pessoal da Observação do Eclipse Anular do Sol, realizada no dia 3 de Outubro de 2005, na Quinta do Pação, Freguesia de Rio Frio, Concelho de Arcos de Valdevez.
À parte uma ligeira neblina matinal, o céu esteve limpo, sem núvens.
A observação foi realizada com um telescópio LX90 a 76x numa ocular 26mm Plossl e uns binóculos 10x50mm.
O registo de imagens foi conseguido através uma câmara analógica NikonN70 com uma objectiva zoom de 100/400mm e filme 35mm para slides Fuji Sensia100ASA, e uma câmara digital CanonPowershot.

07h02Acordar. A manhã apresenta-se com neblina, mas o céu está limpo.
07h27Depois de um pequeno almoço farto, saí para o Local de Observação
07h40Acabei de instalar todo o equipamento e tirei as primeiras fotos.
07h45 - O Sol apareceu entre as árvores, na propriedade ao lado.
08h10O Sol destacou-se das árvores.
08h13A minha vizinha, a Dª Carolina, acena por entre as couves e pergunta o que faço ali
a estas horas do dia. Explico-lhe e convido-a. Diz-me que tem de ir à vila.

08h22É preciso aguentar ... Se não fosse o facto de saber o que se vai passar, o
início do dia seria igual a todos os outros dias.

08h27Não se nota nenhuma alteração sobre os limites do disco solar. Volto a estar

ansioso.
08h38Eu vejo! Dá-se o primeiro contacto. É um ligeiríssimo achatamento sobre o eixo
do bordo superior do Sol...Com o filtro Baader não deu para ver qualquer
proeminência solar ou lunar.
08h41Torna-se mais vísivel a sobreposição da Lua no plano Terra-Sol.
Pela forma como decorre a progressão da sombra, acho que posso concluir que

deste sítio terei visão total do Eclipse Anular. Talvez um pouco descentrado ...
08h58A Lua ocupa agora quase metade do diâmetro aparente do Sol.
A imagem surge como os crescentes islâmicos ou um smile amarelo
09h00Os vértices causados pela inserção da Lua no disco solar são perfeitos.
Ainda se nota bastante turbulência térmica. Os pássaros e os cães continuam a emitir os sons habituais e são distintos os que resultam dos trabalhos rurais nas proximidades.
O vale está coberto por uma ligeira neblina que torna a paisagem acinzentada.

09h25Tenho tirado várias fotos com a NikonN70 na qual tenho montada uma lente
de zoom 400mm que o Zé Manel me emprestou, mas a trabalhar com 200mm.
Por qualquer motivo que ainda desconheço, não consigo fazer fotografias com
Canon PowerShot. Só espero que os slides da Nikon saiam correctos...

09h35Mais de metade do diâmetro aparente do Sol está agora oculto pela Lua.
Aproxima-se o momento do segundo contacto, aquele em que todo o diâmetro da Lua ficará contido no plano da imagem do Sol.
Até ao começo do Eclipse era evidente que a temperatura estava a subir gradualmente (tenho pena de não me ter lembrado em trazer um termómetro para medir a eventual variação durante o eclipse ... ), mas agora noto que está mais frio, pois a minha careca sabe do que estou a falar, quando falo de diminuição de temperatura ....
09h55A diminuição de luminosidade é agora evidente e da temperatura também. Já não é só a falta de cabelo, todo o corpo sente a falta do calor que se apercebia ainda há poucos
minutos. O céu está limpo, mas, no vale mantêm-se uma ligeira neblina.
Estes efeitos não parecem ter afectado o comportamento dos animais. Continuo a ouvir os pássaros e as galinhas a cacarejarem. Os cães ladram, mas acho que ladram como sempre ladram os cães. Próximo, embora sem a ver, ouço uma mulher comentar que parece estar mais escuro e que isso a leva a interrogar-se se não “será daquela coisa do eclipse”.
09h58Já tinha lido que nas observações de eclipses o tempo é terrivelmente curto, que não há tempo a perder ... e que entre o registo fotográfico e a observação tudo se passa
sem que consigamos acompanhar o ritmo a que os acontecimentos evoluem.

09h59A totalidade da imersão da Lua no diâmetro do disco solar, o Eclipse Anular do Sol no seu máximo, já terminou. É evidente a descentragem dos 3 astros.
10h00Recebi muitas SMS’s dos meus amigos, astrónomos ou não. O Rui Santos, que está
em Bragança, diz que foi maravilhoso. O Pedro Afonso ligou-me a dizer que estava nos
degraus da Igreja do Carmo, de óculos de protecção colocados, e que por isso temia que as pessoas lhe começassem a dar esmolas. Acho que ele é homem para agradecer ..
Envio também uma SMS ao Nuno Coimbra, que não pode estar a observar o Eclipse como ele bem gostaria .

10h05Apercebe-se o aumento da temperatura ambiente e o crescendo de luminosidade.
Nestes últimos minutos percebi o que se passava com a Canon Powershot. Quando
colocava o filtro à frente da lente surgia uma dispersão luminosa que afectava a foto.
Consegui corrigir isso ainda a tempo de conseguir um boneco do Eclipse Anular.
As abelhas e as moscas zumbem à minha volta e a mergulho na contemplação da
Natureza em volta.

10h25Os 3 astros continuam as suas rotas e afastam-se cada vez mais do alinhamento. Não posso deixar de imaginar o som mecânico do relógio celeste, em estéreo e ao melhor estilo da “Guerra das Estrelas” do Spielberg.
10h30Continuo a tirar fotos com ambas as máquinas. Lembro-me que talvez seja uma boa ideia construir aqui, nesta leira, o meu observatório permanente. A visão do céu é
enorme e a eclíptica é toda abrangida deste local. Aproveito 4 paus e delimito-me uma área de 2x3m. Parece suficiente ...

10h45Está agora uma temperatura normal, quente, que me obriga a tirar o casaco e a
camisola. Penso no que poderia não ser a nossa vida se não tivessemos o Sol para nos aquecer. Já se torna obrigatório o uso de chapéu.

10h55O rolo de slides começa a chegar ao fim. Reparo agora que não registei o momento
do 3ºcontacto.

11h05Só uma pequena calote de sombra se mantém sobre a zona inferior do disco solar.
11h14O Eclipse está a chegar ao fim. A percentagem de sombra é já pequena. Só é
discernível com a ajuda do telescópio, pois os binóculos 10x50 que estou a usar
praticamente não a registam. Preparo-me para as últimas fotos.

11h17Acabou.
11h25 Sentei-me à mesa de trabalho e, enquanto ouço a Antena2, vou escrevendo as

últimas linhas deste registo.
A luminosidade é intensa e fere os olhos. A neblina mantêm-se estável no vale.
As galinhas já puseram os ovos e deixaram de cacarejar. Perto, uma moto-serra zurze
a madeira de uma árvore que tomba. Os cães recolheram-se à sombra das casotas.
As últimas horas ofereceram-me momentos mágicos na vida.
Penso, também no próximo Eclipse, mas mais na rapidez com que tudo se processou e fico incompreensivelmente absorto sobre a ideia de Tempo e dimensão. Não consigo ter mais ideia nenhuma sobre isto e dirijo a minha atenção de novo para o papel.
Os astros lá vão fazendo o seu caminho e nós o nosso, e eu fico para aqui ao meu geito, satisfeito e aparvalhado, rendido à transitoriedade da efémera importância de neste momento ter assistido ao Eclipse Anular do Sol. E sinto-me bem, pronto.
Uma abelha pousa, por instantes, sobre os meus binóculos e depois volta à sua faina.
Eu, agora, vou ter que carregar quase 40kg de material leira acima, limpar as ópticas e arrumá-los para a próxima observação.
Tenho ainda um entrecosto para grelhar e que vai ser acompanhado com uma litrada de vinho doce, tirado ontem á noitinha da pipa após a vindima no campo da minha vizinha Judite.

2028 ... ?!!

 
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